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Doutorado nos EUA forma mais mulheres

Jornal da Ciência

Doutorado nos EUA forma mais mulheres

25/10/2010

Elas mantêm ainda a liderança frente aos homens na graduação e no mestrado

Pela primeira vez na história, os Estados Unidos formaram mais doutoras que doutores. Além de superar os homens nos PhDs (doutorados), as mulheres mantiveram a liderança entre os que mais recebem diplomas de mestrados e graduações nas universidades americanas.

Segundo dados do Council of Graduate Schools (CGS), a entidade responsável pela medição, 50,4% dos novos doutores formados no último ano são do sexo feminino. E o índice de mulheres que concluíram o mestrado é ainda maior: 60,4%.

A vantagem feminina na pós-graduação americana se deve a um crescente número de mulheres que optou por se aprofundar nos estudos acadêmicos na última década. Essa tendência, porém, pode durar pouco e ser revertida em breve. O relatório do CGS indica que, no último ano, o total de homens que se matricularam em mestrados e doutorados nos Estados Unidos voltou a superar o de mulheres.

Dessa forma, apesar de mais doutoras terem se formado no último ano e provavelmente nos próximos, os homens podem voltar a assumir a liderança em meia década. Além disso, a American Association for University Women (AAUW) afirma que as mulheres continuam recebendo salários inferiores aos dos homens nas universidades americanas. As doutoras formadas hoje, apesar de estarem em maior número, devem receber menos do que seus colegas homens.

Para cada US$ 1 que um homem com graduação avançada recebe de salário, a mulher receberá apenas 77 centavos, segundo a AAUW.

Diferenças. Apesar de haver mais mulheres com PhDs nas áreas de humanas e biológicas, ainda existem menos doutoras nas ciências exatas. Em Engenharia, segundo os dados do CGS, apenas um em cada quatro alunos matriculados no último ano é mulher.

Até hoje, nos Estados Unidos, discute-se porque as mulheres se destacam menos em áreas como física e matemática. A polêmica levou, há alguns anos, à demissão do então presidente de Harvard, Lawrence Summers, que atualmente é um dos principais economistas do governo de Barack Obama. Na época, ele sugeriu que "diferenças inatas" poderiam explicar por que há menos mulheres nas posições mais altas da carreira científica.

A maternidade de muitas doutorandas também coincide muitas vezes com a duração do curso de doutorado, o que representa mais um obstáculo para as mulheres, segundo a AAUW.

Alguns acadêmicos divergem, dizendo que a flexibilidade da universidade facilita mais a vida das mães do que se elas estivessem num escritório. Cunharam até a expressão "dissertation baby" ("dissertação com bebê") para se referir àquelas que usam um dos três anos destinados à redação da tese para ter filho.

Apesar de não reclamar de diferença no tratamento, a brasileira Gabrielle Oliveira, doutoranda em Antropologia na Universidade Columbia, de Nova York, nota que o seu programa é liderado por quatro professores homens.

"Ainda existe um pouco de preconceito na maneira de a disciplina ser ensinada. Nossas leituras obrigatórias são escritas por homens em 90% das vezes. E há menos mulheres que homens no meu departamento."

(Gustavo Chacra)

Brasil é o 3º país com maior proporção de doutoras 

Ainda muito atrás de países desenvolvidos na proporção de doutores em relação ao total da população, o Brasil está na vanguarda mundial da tendência de ter mais mulheres que homens conquistando o título.

Enquanto em diversos países as mulheres ainda estão se aproximando do patamar de doutores homens, desde 2004 as brasileiras são maioria na conclusão de doutorados a cada ano.

Segundo o mais recente estudo demográfico do Centro de Gestão de Estudos Estratégicos (CGEE), ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, em 2008 o país ganhou 11 mil doutores, sendo que 51,5% foram, na verdade, doutoras.

A relação homens/mulheres é semelhante em todas as regiões, com exceção do Norte, onde elas ainda não atingiram a marca masculina e representam 47,8% do contingente total.

"No total, o Brasil é o terceiro país do mundo com maior proporção de formação de doutoras. Ficamos atrás apenas de Portugal e Itália", afirmou Antonio Carlos Filgueira Galvão, um dos diretores do estudo.

Mesmo em campos do conhecimento tradicionalmente dominados por homens, as pesquisadoras brasileiras conquistaram seu espaço. Aos 30 anos, Denise Lazzeri Bombonatti completou em agosto seu doutorado pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), na área em desenvolvimento de softwares.

Ela diz que, apesar de as mulheres ainda serem minoria na área, não se lembra de ter vivido episódios de discriminação. "Nunca senti preconceito por ser mulher."

A vocação para as disciplinas de exatas vem desde criança; o desejo de fazer pesquisa, desde a faculdade. "Fiz iniciação científica durante a faculdade de Ciências da Computação, comecei o mestrado assim que me formei e logo em seguida entrei no doutorado", conta.

Em paralelo à vida acadêmica, Denise sempre atuou no mercado de trabalho. "Desde a faculdade fazia estágio, nunca fiquei só com bolsa. Acho importante aliar essas duas visões diferentes. Elas se complementam."

Hoje, Denise faz consultorias para empresas, mas não pretende parar de estudar. "Ainda estou como pesquisadora do Laboratório de Tecnologia de Software (na Poli) e pretendo começar um pós-doutorado em breve. Só preciso trabalhar um pouco na ideia antes."

Conciliar carreira acadêmica, emprego e vida pessoal tem sido um desafio, mas Denise não reclama. "Precisa, sim, de muita dedicação, mas nunca passou pela minha cabeça desistir do mestrado ou do doutorado. Só gostaria que meu dia tivesse mais horas", brinca. "Durante o doutorado eu casei e montei apartamento como todo mundo."

(Luciana Alvarez)

(O Estado de SP, 24/10)


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