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4ª CNCTI: desafio é construir consenso sobre ações

Jornal da Ciência

4ª CNCTI: desafio é construir consenso sobre ações

24/05/2010

4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (CNCTI) busca legitimidade para apresentar propostas concretas

Se há certo consenso em relação ao diagnóstico sobre a evolução da ciência brasileira nas últimas décadas e sobre as amarras ainda a segurá-la, buscar entendimento em torno das ferramentas para soltar os freios é um desafio para a 4a Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (CNCTI). Com eleições gerais à vista e muitos debates pela frente, surgem algumas questões. A conferência terá legitimidade suficiente para apresentar propostas concretas? As mudanças nos governos são risco ou oportunidade?

O consenso se dá em relação à melhoria das condições para se fazer ciência nos últimos tempos. Planejado e montado há relativamente pouco tempo - cerca de 50 anos - o sistema nacional de ciência e tecnologia foi capaz de construir competências, desenvolver massa crítica e estabelecer certo grau de institucionalidade. O aumento dos investimentos públicos na área, consequência da criação dos Fundos Setoriais, em 1999, e, posteriormente, do alcance de peso político suficiente para impedir seu contingenciamento, completa o cenário.

A melhora geral não significa, por outro lado, que os obstáculos para que o país se desenvolva de acordo com seu potencial tenham desaparecido.

O presidente da SBPC, Marco Antônio Raupp, aponta um deles: a questão do marco legal, cuja tradução maior atualmente é a falta de solução para as objeções colocadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) ao repasse de verbas públicas federais às fundações de apoio à pesquisa. "Isso é urgente, não pode esperar a política", lembra.

Além da legislação inadequada, burocracia, infraestrutura precária e dificuldades para a recomposição de mão de obra nas instituições públicas são frequentemente citadas como entraves.

Para Raupp, há "assimetria" entre o ritmo de reposição de pessoal das universidades (acelerado recentemente) e das unidades de pesquisa do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). "Os institutos são muito importantes para a execução de planos em áreas estratégicas", diz.

A esses problemas, somam-se ainda as desigualdades regionais (e a necessidade de investir em tecnologia na Região Amazônica); a dificuldade de aumentar os investimentos privados em pesquisa e desenvolvimento; e a baixa qualidade do ensino básico oferecido à maioria da população.

Na avaliação do secretário-geral da 4a CNCTI, Luiz Davidovich, se quiser oferecer elementos para uma política estratégica de ciência e tecnologia, a conferência deve trabalhar pelos consensos.

"O que vai garantir a política estratégica é a formação de certos consensos em torno de alavancas fundamentais de desenvolvimento para o país. Vamos ver se a gente chega a um consenso em torno de um conjunto enxuto de pontos", explica Davidovich, reforçando a importância de destacar esse "conjunto enxuto de pontos" do extenso rol de recomendações que serão reunidos no Livro Azul, documento final da conferência.

Carlos Alberto Aragão, presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), lista alguns desses pontos. "O desenvolvimento científico deve mirar as sustentabilidades econômica, ambiental e social do país", afirma Aragão, secretário-executivo da 3ª CNCTI e antecessor de Davidovich até janeiro deste ano.

O presidente do CNPq destaca ainda que a garantia de uma educação de qualidade desde a primeira infância também deve constar entre as propostas consensuais.

Se de fato quiser cumprir seu objetivo de debater os rumos de uma política de Estado para C&T, contudo, a 4a CNCTI deverá ir além do desenho de diagnósticos - precisará discutir propostas concretas para vencer os atuais problemas.

Na visão de Davidovich, isso é um desafio a ser superado nos debates do fim do mês. "Já existem propostas. Mas isso [consenso em torno de ações] nós temos que buscar", analisa. Segundo ele, dos problemas mais comumente diagnosticados, as propostas para aumentar a inovação nas empresas são as que estão em estágio mais avançado de entendimento.

Pensando em buscar caminhos consensuais, a SBPC sistematizou propostas de ação em duas notas técnicas. As iniciativas versam sobre o marco legal das atividades científicas e tecnológicas (sobretudo as leis que envolvem licitações e contratos entre instituições públicas e privadas, pesquisas com biodiversidade e importação de insumos) e sobre a educação.

Cenário

Para Marco Antonio Raupp, o contexto atual favorece os debates. "As conferências contribuem sempre para aprimorar a política científica. As coisas vão se aperfeiçoando", analisa. Segundo o presidente da SBPC, a existência do Plano de Ação de Ciência, Tecnologia e Inovação 2007-2010 (PACTI 2007-2010) e o aumento dos investimentos públicos federais para executá-lo são importantes. "Os debates na conferência não começarão do zero", garante.

"O cenário atual é promissor", corrobora o presidente da Sociedade Brasileira de Física (SBF), Celso Pinto de Melo. Segundo ele, no entanto, o contexto do momento pode influenciar as discussões de Brasília. "Em 2011, seja lá quem vença as eleições, teremos mudanças", alerta. "Por isso, precisamos fazer com que a conferência possua peso político para garantir a internalização das propostas no Estado".

Segundo o ministro da Ciência e Tecnologia, Sergio Rezende, a conferência tem legitimidade para deixar propostas para uma política de Estado de ciência e tecnologia, "porque no Conselho Consultivo e na Comissão Organizadora [da 4ª CNCTI] há pessoas que não são do governo".

De acordo com a presidenta do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), Lucia Melo, o próprio estágio atual de desenvolvimento exige a construção de consensos, ouvindo os diversos segmentos do sistema nacional de C&T, "para a criação coletiva de uma agenda de futuro, estruturante e mobilizadora para o Brasil".

"No momento, há mudanças de patamar nos investimentos para a pesquisa, com a implementação de investimentos de apoio à inovação e na gestão da pesquisa. Nesse contexto, será necessário cada vez mais construir agendas estratégicas com políticas de Estado", analisa Lucia, em resposta enviada por correio eletrônico.

(Marcelo Medeiros e Vinicius Neder, do Jornal da Ciência)

Nota da redação: Esta matéria foi publicada na edição 666 do "Jornal da Ciência", que tem conteúdo exclusivo. Informações sobre como assinar a edição impressa pelo fone (21) 2295-5284 ou e-mail jciencia@jornaldaciencia.org.br


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