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O futuro à porta

Correio Braziliense

O futuro à porta

08/03/2010

MCT desenha linha do tempo mostrando prováveis inovações nos próximos 20 anos. Dados apontam para coisas como robôs-soldados, baterias de celular carregadas a cada dois meses e nanotecnologia em expansão

Igor Silveira

Em 2030, ao fazer o check-in com um robô no hotel, você vai conferir as notícias em seu telefone celular, com a bateria carregada pela última vez há pelo menos dois meses. Nele, vai ler novidades sobre uma ação ofensiva do Exército norte-americano. O ataque foi arquitetado por um sistema de inteligência artificial, diminuindo as chances de erros humanos. Nessa época, caro leitor, o Brasil, país com estimadas 229 milhões de pessoas, sofrerá com os efeitos do aquecimento global. As consequências serão devastadoras: 10 anos antes, a economia nacional terá perdido R$ 7,4 bilhões em safras de grãos por causa das alterações no clima. Essas não são previsões aleatórias, extraídas com base em histórias de ficção científica. As situações listadas acima estão presentes em uma linha do tempo, fruto de uma pesquisa minuciosa, desenvolvida pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos do Ministério da Ciência e Tecnologia (CGEE/MCT).

Criada para que o Brasil possa, a partir das projeções, elaborar estratégias de crescimento e planejar a melhor maneira de absorver as transformações, a linha do tempo não é simplesmente uma especulação. Os dados foram obtidos com fontes confiáveis, como governos e grupos de pesquisas renomados. Os acontecimentos previstos foram selecionados depois de um estudo das tecnologias existentes atualmente. Dessa maneira, verificou-se a viabilidade e a probabilidade dos eventos se concretizarem. O projeto começou a ser desenvolvido há cerca de quatro anos e envolveu funcionários de todo o CGEE/MCT, sob a batuta do Núcleo de Competência Metodológica (NCM) da organização social.

“Levamos em consideração os aspectos políticos, econômicos e culturais das regiões estudadas. Depois, fomos atrás de instituições com credibilidade. Ou seja, não é uma simples previsão. É uma coleta seguida de uma análise de dados, observando sempre a contextualização dos temas escolhidos”, explica Cláudio Chauke, especialista em gestão de conhecimento e da tecnologia da informação da Universidade Católica de Brasília e um dos responsáveis pelo projeto. “Montamos, também, uma sistemática para que essa linha do tempo seja monitorada e atualizada de acordo com o andamento dessas tendências”, completa.

Invenções
Alguns dos eventos citados no projeto do CGEE/MCT estão previstos para um futuro muito próximo. Em 2011, por exemplo, mais de 2 bilhões de pessoas terão acesso à banda larga por meio de aparelhos portáteis, segundo a World Future Society — uma tradicional organização sediada nos Estados Unidos, fundada em 1966, que reúne cientistas espalhados por 80 países.

Pouco mais adiante, em 2013, a tecnologia no campo de controle de voz estará tão desenvolvida que 30% das tarefas rotineiras do computador dispensarão o uso de teclado ou mouse, de acordo com informação colhida na empresa TechCast. A nanotecnologia também será muito importante. Um estudo batizado de Convergência tecnológica, do próprio CGEE, mostra que essa área deve movimentar, daqui a cinco anos, US$ 1 trilhão em todo o mundo, além de empregar 2 milhões de pessoas nos Estados Unidos.

A participação dos robôs no futuro, ainda segundo a linha do tempo, será determinante na rotina dos seres humanos. Todas as inovações conhecidas até hoje na área de robótica contribuem para a projeção de tarefas mais complexas realizadas inteiramente por meio de inteligência artificial. Também em 2015, o atendimento em aeroportos e hotéis, muito provavelmente, será mais rápido e eficiente com os robôs, de acordo com a Henley Centre HeadlightVision. As Forças Armadas dos Estados Unidos acreditam que, no mesmo ano, um terço das tropas será composto por máquinas que realizam funções dos humanos com mais precisão.

Sadek Alfaro é professor da Universidade de Brasília e Ph.D em engenharia mecatrônica. Para ele, a capacidade de armazenamento do cérebro humano foi superada há muito tempo por computadores. O poder de processamento de dados também não será um grande obstáculo a ser ultrapassado no campo da eletrônica. “O grande entrave é que ainda não inventaram qualquer protótipo que consiga superar a capacidade de discernimento de um soldado, por exemplo. Estive na Universidade de Berkeley, nos Estados Unidos, há pouco tempo, e pude acompanhar alguns projetos muito interessantes. Com certeza, serão muito úteis. Porém, há características nos humanos que nunca poderão ser transferidas para robôs”, garante.

Projeções plausíveis
Assim como Alfaro, o engenheiro eletricista Pedro Berger afirma que a linha do tempo desenvolvida pelo CGEE/MCT na área de ciência, tecnologia e inovação foi bem elaborada. Segundo o profissional, que também é especialista em sistemas de comandos de voz, as projeções são bastante plausíveis, apesar da dificuldade em estabelecer datas precisas dos acontecimentos. Berger ressalta que, talvez, alguns dos eventos citados deverão levar mais tempo para se realizar.

“Acho que, realmente, os comandos mais tradicionais dos computadores poderão ser realizados por meio da voz. No entanto, é difícil prever quantos comandos serão cadastrados e se os sistemas estarão funcionando plenamente daqui a três anos. Minha experiência me mostra que, em um futuro bem próximo, o CGEE poderá confirmar várias das previsões. A precisão das datas é que não é tão segura assim”, ressalta.

Mais que revelar tendências, a linha do tempo é uma ferramenta muito importante para indicar os focos de atuação do Brasil nas áreas de política e economica. O pesquisador Cláudio Chauke faz uma observação importante quanto à finalidade e à diferença do projeto em relação às criações de cenários, comuns em previsões mal fundamentadas: “Nos cenários, tomamos como premissa que alguns acontecimentos podem ocorrer segundo um conjunto de delimitadores definidos a priori, assim, trabalhamos dentro dessas situações. A linha do tempo prospectiva dá grandes contornos para que se façam análises e definições de estratégias”.

"Minha experiência me mostra que, em um futuro bem próximo, o CGEE poderá confirmar várias das previsões. A precisão das datas é que não é tão segura assim”

Pedro Berger, engenheiro eletricista

Palavra de especialista
Guia de tendências
O desenvolvimento desse tipo de ferramenta é muito importante. A divulgação das informações ajuda os atores envolvidos no campo tecnológico a preverem os investimentos e as consequências de cada uma das projeções. Nesse caso, a diversidade de assuntos é muito grande. Por isso, há uma dificuldade de indicar as datas com precisão. Eu vejo essa linha do tempo mais como um guia de tendências, uma ideia da evolução nos segmentos de ciência, tecnologia e inovação. Esses acontecimentos, no entanto, dependem de uma série de fatores, como, por exemplo, na área da internet, a relação entre consumidores e prestadoras de serviço. Mas os dados não trazem nada de espantoso. Ao contrário. As previsões são bastante viáveis. Mas podem acontecer dentro de uma margem de erro aceitável.

José Camargo da Costa é professor da UnB e especialista em micro e nanoeletrônica

Confira a linha do tempo em outras áreas, como educação, energia e saúde

Fonte: Correio Braziliense impresso do dia 08/03/2010


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