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Inovação e saúde despertam mais interesse em brasileiros que política

Correio Braziliense

Inovação e saúde despertam mais interesse em brasileiros que política

14/07/2015

Segundo especialistas, o cenário é propício para o aumento dos investimentos em divulgação científica

Nem Operação Lava-Jato nem escândalo da Fifa. O que os brasileiros querem mesmo saber é das novidades em ciência e tecnologia, com ênfase nas pesquisas relacionadas a meio ambiente e saúde. Nesta nação de curiosos, assuntos de política, esportes e moda têm muito menos importância que a temática da inovação. A surpreendente constatação aparece no estudo Percepção pública da C&T no Brasil 2015, apresentado ontem na reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SPBC), que começou no domingo, em São Carlos (SP).

A enquete foi conduzida pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE) e pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), que ouviram 1.962 pessoas com mais de 16 anos e de todas as regiões do país entre dezembro de 2014 e março deste ano. É a quarta vez que se aplica o questionário no Brasil, o que permitiu comparar a mudança do interesse da população pela produção científica. Em 1987, 2006 e 2010, realizaram-se estudos semelhantes.

Embora, em relação às duas investigações mais recentes, o percentual de pessoas que se disseram interessadas ou muito interessadas tenha sofrido uma leve redução, isso foi observado em relação aos demais temas, como economia, moda e arte. Para elaborar as 105 perguntas, os pesquisadores consultaram iniciativas parecidas, de outros países. Assim, verificaram, por exemplo, que os brasileiros se empolgam mais com assuntos de ciência que os europeus.

“O resultado surpreende positivamente. Não chega a ser uma surpresa total porque, nas pesquisas anteriores, já se havia constatado a reverência dos brasileiros às informações do conhecimento, maior que de em outros países que fizeram a mesma pesquisa, como a Inglaterra. E isso em um momento em que há outras questões demandando a atenção da população”, observa o cientista social Mariano Laplane, presidente do CGEE. Ele destaca que o interesse do país pela ciência desafia o senso comum, segundo o qual o brasileiro rechaça o tema. “É uma população curiosa, que valoriza a ciência e a inovação. Não se pode deixar de aproveitar isso, principalmente considerando que a pesquisa foi feita em todas as regiões do país, com vários níveis de renda, refletindo o brasileiro médio. Essa não é a realidade de um país atrasado”, afirma.

Desafios
Os dados da pesquisa também dimensionam os desafios que o Brasil tem pela frente para satisfazer a curiosidade de seu povo. A televisão e a internet são os meios mais utilizados pela população para se inteirar sobre as novidades científicas. Livros, revistas e jornais são a fonte de menos de 12% dos entrevistados — não que eles desprezem esses meios, mas por considerarem insatisfatório o número de informações disponíveis por eles. Já os programas de tevê, as redes sociais e os sites são acessados com frequência pelos brasileiros que querem saber mais sobre os temas. “Os cadernos sobre ciência e tecnologia estão cada vez menores ou deixando de existir”, lamenta Mariano Laplane, a respeito da mídia impressa.

O estudo também reforça a necessidade de se investir mais nos espaços de divulgação científica e tecnológica que podem ser explorados pelo público. Nos últimos 10 anos, aumentou significativamente a participação dos brasileiros nas feiras e olimpíadas de ciência (de 13% para 21%), na Semana Nacional de Ciência e Tecnologia (de 3% para 8%), além das idas a museus e outros centros científicos-culturais (de 4% para 12%). Contudo, metade dos entrevistados apontaram a dificuldade de acesso a esses lugares como razão de não os visitar. “Infelizmente, o acesso à informação é insuficiente e não atende nem de perto a expectativa que a população tem. São poucas as visitas a museus e instituições, mas não é falta de interesse, é o baixo acesso. Quando se faz um evento grande, a população se mobiliza. A Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, por exemplo, tem uma repercussão muito grande. Mas precisamos de mecanismos permanentes”, destaca Laplane.

Outra deficiência identificada na pesquisa é o desconhecimento que os brasileiros têm dos cientistas e das instituições do país. Apenas 12% souberam citar um local de produção científica e somente 6% conheciam o nome de um pesquisador nacional. Em 2010, esses percentuais foram 18% e 12%, respectivamente. O relatório do CGEE destaca que, mesmo entre pessoas com título superior, poucos mencionaram um cientista. “A nossa ciência está evoluindo e tem muita produção importantíssima, mas esses resultados não aparecem. Se conseguirmos romper a barreira, fazendo com que as nossas conquistas científicas estejam na grande mídia, teremos cada vez mais jovens sonhando em ser cientistas em vez de jogadores de futebol”, disse, em uma coletiva de imprensa, a presidente da SPBC, Helena Nader. O presidente do CGEE reconhece que, muitas vezes, os próprios cientistas não se aproximam da população e destaca a necessidade de eles falarem mais claramente sobre suas descobertas, principalmente para a população jovem.


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